Lei para uso de Inteligência Artificial: proposta abrangente é apresentada no Senado

Por Sidney Dias*

O Projeto de Lei n° 2338, de 2023, apresentado pelo Senador Rodrigo Pacheco, no dia 3 de maio, busca estabelecer normas gerais para o desenvolvimento, implementação e uso de sistemas de Inteligência Artificial (IA) no Brasil. O objetivo é “proteger os direitos fundamentais e garantir a implementação de sistemas seguros e confiáveis, em benefício da pessoa humana, do regime democrático e do desenvolvimento científico e tecnológico.”

IA é uma tecnologia que tem o potencial de transformar positivamente muitos aspectos da sociedade e da economia. Por outro lado, ela também traz riscos e desafios – como possíveis dilemas éticos, discriminação, violação de direitos humanos, impactos ambientais e aumento da vulnerabilidade a ataques cibernéticos. Essas considerações tonam clara a importância de se assegurar que a IA seja desenvolvida e utilizada de forma confiável e responsável, observando-se os princípios democráticos, a prevalência da lei e da dignidade humana.

A apresentação do PL é semelhante a iniciativas adotadas em outros países. Nesse aspecto, a principal referência é a proposta apresentada para regulamentação do uso da IA na União Europeia, em abril de 2021. Essa proposta se apoia em quatro pilares: classificação dos sistemas quanto aos riscos, uma estrutura de governança que envolve autoridades governamentais, um mecanismo de suporte para incentivar a pesquisa, o desenvolvimento e a educação em IA, e o relacionamento entre países e organizações, buscando promover valores e padrões de IA através do diálogo e da cooperação.

Regulamentação e inovação

O desafio de se encontrar o equilíbrio entre a regulamentação necessária e o espaço para a inovação nos processos e negócios com o uso da tecnologia de IA é grande. Considere, por exemplo, que o PL n° 2338/2023 prevê que um sistema que efetue a avaliação do risco de crédito de uma pessoa utilizando recursos de IA é considerado de alto risco e, portanto, sujeito a vários controles e procedimentos, desde a sua concepção até a sua efetiva utilização, com monitoramento permanente de sua operação.

Hoje, praticamente todas as instituições que oferecem crédito utilizam livremente sistemas de avaliação de risco com o uso de Inteligência Artificial – seja eles sistemas próprios ou sob a forma de serviços providos por terceiros. Com base nessas avaliações, as instituições tomam decisões sobre concessão de empréstimos e financiamentos e, ainda, sobre as taxas de juros que aplicarão em cada caso – maiores ou menores.

Outro exemplo pode ser encontrado no setor de seguros, onde é cada vez mais comum o uso de sistemas baseados em IA para a realização de vistorias – tanto para aceitação de riscos quanto na avaliação de danos decorrentes de sinistros. Vários grupos seguradores nacionais e internacionais têm investido ou estão investindo bastante na criação de soluções que juntam dados e informações de fontes internas e externas utilizando recursos de IA para tomada de decisão em seus negócios.

Mas, o fato é que esses sistemas baseados em Inteligência Artificial foram ou estão sendo desenvolvidos de acordo com regras e procedimentos  próprios de cada empresa ou conglomerado e, portanto, sem observância de padrões definidos em Lei com esse foco específico. 

É hora de se olhar para isso.

Discussão oportuna

O Projeto de Lei apresentado não proíbe o uso de ferramentas como essas, mas propõe a criação de uma série de mecanismos e controles para assegurar a transparência de sua utilização, possibilitando que as pessoas impactadas possam ter conhecimento dos critérios empregados e a recorrer – administrativa e judicialmente – caso entendam terem sido discriminadas, recebido tratamento injusto ou inadequado ou, de alguma forma, terem sido prejudicadas em seus direitos.

Até mesmo a utilização dos já conhecidos chatbots inteligentes será afetada. O impacto da aprovação das disposições contidas no PL n° 2338/2023 é amplo e atinge todos os setores da economia e da sociedade, organizações públicas e privadas.

Certamente, a discussão deverá contemplar vários aspectos para a criação de novas aplicações de IA. É importante lembrar que, também, deverá ser debatido o que se deve fazer com as incontáveis ferramentas existentes à época da publicação da Lei: as empresas terão um prazo para adaptação de seus procedimentos e sistemas às novas disposições legais? Qual será a documentação mínima exigida para conformidade com as novas regras? 

O Projeto de Lei n° 2338/2023 é oportuno e traz para discussão ampla pelo Congresso um tema que ganhou grande visibilidade com o impacto da rápida difusão nos últimos meses das chamadas tecnologias generativas – como o ChatGPT – que podem transformar profundamente o trabalho, os negócios e a vida em sociedade.

* Sidney Dias é diretor da Conhecer Seguros e profissional experiente do mercado de seguros e finanças. Mestre e Doutor em Informática (PUC-Rio) e Administrador (FGV/EAESP). Membro da IEEE/Computer Society, da Association for Computing Machinery – ACM. Corretor de seguros habilitado em todos os ramos.

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