Open Insurance: a concorrência nos seguros vai aumentar?

Por Sidney Dias*

A Susep colocou em Consulta Pública, no dia 22 de abril, minutas de Resolução e de Circular para regulamentação do Sistema de Seguros Aberto – o Open Insurance. O prazo para apresentação de sugestões à autarquia vai até o dia 25 de maio deste ano.

Este artigo é apenas uma primeira análise do panorama. O tema é amplo e demanda análises mais detalhadas, para que se obtenha uma compreensão mais profunda das transformações pelas quais o mercado de seguros passará nos próximos meses e anos.

Mas, afinal, o que é o Open Insurance? Não existe uma definição precisa, consolidada e universalmente aceita sobre o que isso realmente significa. Para simplificar, pode-se utilizar a visão da Susep: Open Insurance é o “compartilhamento padronizado de dados e serviços por meio de abertura e integração de sistemas no âmbito dos mercados de seguros, previdência complementar aberta e capitalização”(**).

Como se pode ver, isso é bem abrangente; mas, utilizando-se o conceito e as propostas de normativos para o mercado brasileiro apresentadas pela Susep e dando-se uma olhadinha em algumas iniciativas e práticas de outros mercados, é possível irmos entendendo a transformação que o Open Insurance trará para o nosso mercado.

E a mudança é grande: tudo indica que a concorrência vai aumentar – tanto para seguradoras quanto para os corretores de seguros.

Transformação do mercado pela inovação e empoderamento do consumidor

O que a Susep está fazendo é colocar em prática, no mercado de seguros, o que está expresso na Lei 13.709/18 – a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados). Essa lei está em vigor e garante a cada pessoa o direito à portabilidade dos seus dados, podendo demandar ao seu fornecedor de produtos ou serviços que forneça os seus dados a outros fornecedores.

Essa mudança, por outro lado, está relacionada com outras iniciativas introduzidas pela Susep para a dinamização e modernização do mercado de seguros brasileiro – como o Sistema de Registro de Operações (SRO) e o sandbox regulatório, por exemplo.

O Open Insurance está associado, também, à iniciativa do Open Banking, que é conduzida pelo Banco Central e começou a ser colocada em prática no ano passado. A previsão é de que a portabilidade dos dados sobre seguros e previdência tenha início em dezembro de 2021. Logo, há necessidade do setor de seguros se preparar para que isso possa ocorrer.

A perspectiva do consumidor

De imediato, é possível antever que a cadeia de valor dos seguros massificados será fortemente impactada, enquanto os seguros de grandes riscos e aqueles chamados de personalizados terão, presumivelmente, um impacto bem mais reduzido.

Para ficar mais claro, considere o caso do Seguro de Automóvel, reconhecidamente um tipo de seguro que possui uma oferta de produtos bastante semelhantes entre si. Quando isso ocorre, é comum que o foco da atenção do consumidor se desloque para o preço do produto, uma vez que ele não percebe diferenças significativas entre os concorrentes.

Com o Open Insurance, o titular de uma apólice próxima do seu término de vigência pode solicitar à seguradora que efetue o compartilhamento dos seus dados pessoais e do seguro com outras seguradoras para obter cotações e decidir por aquela oferta que, na sua visão, seria a mais adequada às suas necessidades.

Tudo isso de forma digital, com tempos mínimos para sua realização. Fica claro que, à semelhança do que está planejado e já em implementação no Open Banking, o consumidor decidirá sobre o compartilhamento dos seus dados, buscando o que considera ser o melhor atendimento e a melhor relação custo/benefício.

A interação por canais digitais para buscar alternativas de solução e formar opinião é algo típico dos consumidores das chamadas Geração Y (ou Milênio) e Geração Z. Se considerarmos que as pessoas da Geração Y estão na faixa etária dos 25 aos 40 anos e os da Geração Z estão com idades entre 10 e 25 anos, há poucas dúvidas sobre a importância assumida pelos canais digitais.

A perspectiva da seguradora

As seguradoras deverão disponibilizar dados sobre seus produtos e coberturas. De igual forma, deverão também ceder a outras entidades os dados dos segurados – tanto os pessoais quanto os relativos aos seguros contratados – sempre que demandados expressamente pelos seus titulares.

Em uma primeira análise, isso traz ameaças e oportunidades para cada seguradora que já atua no mercado. Como ameaça, de imediato se visualiza que o compartilhamento dos dados pelo Open Insurance e o Open Banking reduz as barreiras de entrada no mercado de seguros brasileiro. Os novos entrantes – sejam companhias tradicionais ou insurtechs – podem ofertar produtos inovadores, com preços mais competitivos, particularmente para os produtos massificados.

Do lado das oportunidades: quem já está bem situado no mercado pode tirar um bom proveito dessas mudanças. As grandes seguradoras, no nosso mercado, estão ligadas a bancos e podem aproveitar, de forma combinada, as oportunidades trazidas pelo Open Banking com aquelas trazidas pelo Open Insurance.

Análises mais aprofundadas, em função das características de cada seguradora, irão evidenciar outras possíveis oportunidades e ameaças.

De qualquer forma, a pressão competitiva entre as seguradoras aumenta.

A perspectiva do corretor de seguros

As minutas de normas não abordam mudanças no papel do corretor de seguros – ao menos, diretamente. Mas, temos um indicador de mudança importante, que está presente na minuta de Resolução: um novo tipo de entidade foi conceituado – a sociedade iniciadora de serviço de seguro:

Sociedade iniciadora de serviço de seguro: sociedade anônima, exclusivamente digital, credenciada pela Susep como participante do Open Insurance, que provê serviço de agregação de dados, painéis de informação e controle (dashboards) ou, como representante do cliente, compartilha serviços relacionados a seguros, por ele consentidos, sem deter em momento algum os recursos pagos pelo cliente, à exceção de eventual remuneração pelo serviço, ou por ele recebidos;” (**)

Pela leitura, já é possível entender que essa nova entidade não será uma corretora de seguros: a exigência de que seja uma sociedade anônima, exclusivamente digital, já afasta essa possibilidade. Outra indicação importante é que esse integrador pode, eventualmente, ser remunerado diretamente pelo cliente.

Olhando para entidades similares em outros mercados – como o americano e os mercados de alguns países europeus – encontramos a figura do agregador de dados. As particularidades variam de acordo com o mercado local; geralmente, são empresas que oferecem um ponto centralizado de informações sobre produtos de seguros de diferentes companhias, facilitando a análise pela pessoa interessada na compra de proteção por seguro.

Elas prestam serviços tanto para as pessoas e empresas interessadas em seguros, quanto para os corretores de seguros que, em lugar de buscar informações sobre produtos, coberturas e preços em diferentes seguradoras, acessam e obtêm as informações de que necessitam nesses agregadores de dados.

Difícil dizer, agora, se isso vai trazer melhorias – ou não – para o corretor de seguros tradicional. O que se sabe é que o corretor, como consultor especializado em gestão e transferência de riscos através de seguros, continuará sendo muito importante para a proteção das pessoas, famílias e negócios. Nenhum agregador de dados, exclusivamente digital, irá substituir o corretor nesse papel.

 

Como se pode ver, o assunto é amplo e instigante e, neste momento, estamos  apenas no começo das definições. Tem muito, ainda, por ser feito. Isso vai demandar outras análises e, consequentemente, outros artigos.

 

* Sidney Dias é diretor da Conhecer Seguros, doutor em Informática e bacharel em Administração Pública. Também é corretor de seguros habilitado em todos os ramos, professor em cursos de graduação e pós-graduação, e membro de instituições internacionais, como da IEEE/Computer Society, da Association for Computing Machinery (ACM) e da International Coach Federation (ICF).

(**) Minuta de Resolução CNSP – Consulta Pública Susep 12/2021

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