Nos dias 07 a 10 de junho, foi realizado o “I Simpósio Direito de Seguros – Flexibilização das Bases Contratuais de Seguros no Mercado Brasileiro”, com a coordenação dos professores da Conhecer Seguros, Christiane Hessler Furck e Walter Polido. O evento foi promovido pela Escola Superior de Advocacia da OAB/SP (ESA/SP) e teve participação do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Paulo de Tarso Sanseverino, além de diretores da SUSEP, advogados especialistas no tema e de especialista em corretagem de seguros.
Diretores da Susep destacam as inovações promovidas pela autarquia
O primeiro encontro do evento teve participação dos diretores técnicos da SUSEP, Igor Lins da Rocha Lourenço e Rafael Scherre, para falarem sobre a flexibilização das bases contratuais dos seguros.
Rafael Scherre ilustrou o novo marco regulatório dos produtos com um infográfico. Segundo o diretor da autarquia, os movimentos de flexibilização pretendem gerar o crescimento do setor de seguros através de alguns pontos: maior concorrência, liberdade contratual e transparência, além de inovação com produtos flexíveis, o aumento de coberturas, menor custo de capital e redução nos preços.
O diretor assegurou a proteção do consumidor com as práticas de conduta e transparência, determinadas na Resolução CNSP 382/20, que estabelece, entre outras regras alinhadas com o mercado internacional, o dever do corretor em expor o valor da comissão a ser recebida em cada apólice antes da assinatura por parte do segurado. “O regulador deve trabalhar estabelecendo um conjunto de regras que atenda o consumidor, prezando por um ambiente competitivo entre os players do mercado”, destacou Scherre. Como projeção, foi mencionado o processo de consulta pública para os seguros de pessoas, já em preparação pelo corpo técnico da Susep.
Para Igor Lourenço, a legislação do mercado continuava pautada na realidade da década de 70, fazendo-se necessárias as mudanças. O diretor espera que a liberdade garantida pela flexibilização estimule a competitividade na criação de produtos distintos para atender melhor às especificidades dos consumidores. “O desafio (da Susep) é harmonizar os interesses entre os participantes da relação de consumo com o desenvolvimento econômico e tecnológico”, garantiu. Loureço ainda apontou como o seguro é o instrumento que garante o risco, em constante adaptação para melhor atender às necessidades dos segurados. “Devemos basear a segurança jurídica em premissas corretas”, conclui.
A nova função do corretor de seguros segundo especialistas
No segundo dia se reuniram como palestrantes o corretor de seguros Richard Hessler Furck e a advogada Christiane Hessler Furck, com a mediação do advogado Danilo Moraes para falarem sobre o corretor de seguros no cenário da flexibilização das bases contratuais.
Richard Furck explicou a lógica do “cisne negro” – um evento altamente improvável, extremamente significante para o ser humano e, por sua improbabilidade e significância, gera o sentimento de se tratar de um evento inevitável. Assim, o corretor categorizou a pandemia da covid-19 e as inovações da Susep, como “cisnes negros” por gerarem novos comportamentos em todas as partes nas relações de consumo, além da expressiva mudança e adaptação tecnológica necessárias.
Richard exemplificou a situação do mercado de seguros através de gráficos e ainda projetou a possibilidade de um crescimento de cinquenta anos em apenas cinco, em face das inovações normativas. Para o corretor, por se tratar de um mercado muito conservador, há muito espaço para desenvolvimento e as normativas da Susep exigirão movimentação intensa dos players. “Se o seguro será ofertado em qualquer lugar e com possibilidades de pacotes que multiplicam coberturas, o segurador não poderá mais ser seletivo com seus produtos. Isso afetará em muito a competitividade no mercado”, prevê o corretor.
Christiane Furck tratou do papel do corretor e a necessidade do preparo técnico para a adaptação às novas normativas, sobretudo, destacou a transparência nas relações comerciais como principal ferramenta para tornar o mercado confiável. “As apólices guarda-chuvas (umbrellas) são exemplos práticos de como o corretor precisa conhecer as circunstâncias dos riscos a serem segurados e os produtos envolvidos para garantir uma venda que atendará por completo as necessidades do segurado”, afirma.
Para reforçar a relevância da atividade do corretor de seguros, Christiane também citou o artigo 126, do Decreto-Lei 73/1966, o qual estabelece ao corretor, pessoa física ou jurídica, a responsabilidade civil perante a sociedade seguradora e o segurado por prejuízos acarretados no desempenho do exercício da profissão. “O corretor se torna peça fundamental e precisará de preparo técnico para desempenhar a função de intermediário e angariar contratos de seguros para as sociedades seguradoras”, destacou.
Walter Polido, especialista da Conhecer Seguros, mostrou-se animado pela diminuição no “estoque regulatório”. Para Polido, quem deve elaborar as bases contratuais é o mercado privado, não a Susep, entretanto, para isso é necessário capacitação profissional. “Se antes o corretor tinha respaldo dos clausulados padrões, agora ele tem a caneta para auxiliar a seguradora no desenho do produto específico ao cliente. Mas, para isso é necessário conhecimento e especialização”, indicou.
Danilo Moraes, advogado e mediador das questões do público no evento, destacou sua animação em viver um período de mudanças. “Como pioneiros, é nosso papel desmitificar os novos regulamentos e passar toda a informação possível para o consumidor”, aponta.
Advogados debatem sobre o contrato de seguros
No terceiro encontro os advogados Marcelo Galiciano Nunes e Cassio Gama Amaral abordaram o tema “Teoria da Adstrição em Sinistros – Regulação Administrativa Vis-à-Vis Ação Judicial e o Negócio Jurídico Processual”. O debate foi conduzido pelo advogado e professor da Conhecer Seguros, Marcio Alexandre Malfatti.
Marcelo Nunes destacou os fundamentos da teoria da adstrição, a qual está radicada no fato de as justificativas adotadas pelas Seguradoras quando da negativa do pagamento de indenizações, na fase administrativa, não podem ser alteradas em sede judicial. Não havendo fatos novos, as Seguradoras não poderiam apresentar outros elementos. O especialista desaprova a conduta de protelação do mercado, em suas palavras, a postura de “quanto mais tempo levarem os processos em juízo, melhor, pois menores serão as propostas de acordos, ou seja, dos valores em conflito”. Ainda segundo Nunes, condutas despropositadas no procedimento de regulação de sinistros, ainda mais sem consenso entre as partes, levam apenas à judicialização.
Através de um caso específico, o qual gerou ação judicial, Marcelo apontou “o primeiro risco é o que vale. Devemos cumprir os contratos e as regras que vigoram, de modo a criar no mercado a expectativa de confiança e veracidade, refletidas no consumidor”. O especialista indicou que determinada Seguradora emitiu apólice de risco profissional a segundo risco de outra Seguradora, mas não acompanhou integralmente os termos e condições da apólice original, contrariando a prática internacional sobre o mecanismo de apólices em excesso.
Cassio Gama Amaral abordou o negócio jurídico processual sobre direitos que permitem auto-composição. Segundo o especialista, trata-se de um mecanismo que flexibiliza processos no procedimento judicial, previsto nos artigos 190 e 191 do Código de Processo Civil, para que se atinja mais eficiência e agilidade. Sem usurpar as prerrogativas do juiz, as partes podem compor, abreviando os trâmites dos processos. Por exemplo, admitindo que as provas periciais já produzidas durante a fase administrativa da regulação dos sinistros sejam acatadas na esfera judicial, sem a necessidade de o juiz mandar reproduzir nova perícia e nem sempre executada por profissional especializado. Ainda segundo o advogado, vários procedimentos podem ser acordados entre as partes, abreviando a resolução dos casos, assim como economizando os custos da demanda. “Embora não vede em negócios de contratos de adesão, importante redobrar a atenção para evitar abusividades”. No mesmo sentido, Cassio indicou que o mercado necessita de processos que emitam um pagamento ou negativa rápida dos sinistros.
Para Cassio, falta elegância processual que deixa de ser a praxe do mercado, caracterizado, em suas palavras, por um litígio competitivo entre as partes. Segundo o advogado, há alternativas para as soluções de disputas que não acolhidas pelas seguradoras. “A arbitragem é um meio dito “caro” pelo mercado, mas extremamente eficiente e de ótimo custo benefício, sobretudo, pode ser modulada por quem estipulou a cláusula compromissória. A mediação é outro meio que deveria ser explorado com maior frequência nos conflitos envolvendo os seguros”, esclareceu.
Marcio Malfatti, debatedor do encontro, lembrou que qualquer contrato deve partir da premissa de que há boa-fé objetiva entre as partes, sendo no pré-contrato, durante e pós. Para o professor, a boa-fé entre as partes é a única maneira de ocorrer o cumprimento de qualquer contrato de maneira ideal, cuja cultura deve ser estabelecida no mercado de seguros. Sobre a judicialização encontrada nos seguros, o especialista lembrou que “85% do tempo de um processo se passa nos cartórios, sendo que a harmonia entre as partes poderia acelerar a solução dos processos”. Sobre as novas normas da Susep, Malfatti lembrou que elas incentivam esta harmonia, sugerindo a adoção dos meios alternativos nas apólices.
Ministro do STJ fala sobre o contrato de seguros
Encerrando o evento, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Paulo de Tarso Sanseverino, tratou sobre “O Dever de Declaração Inicial do Risco no Contrato de Seguros”. Os professores da Conhecer Seguros, Christiane Hessler Furck e Walter Polido, mediaram a palestra.
Walter Polido iniciou a live introduzindo as questões contratuais relacionadas ao tema, destacando a importância de questionários minuciosos na pré-contratação do seguro. “Novas perguntas não podem surgir na hora do acionamento do sinistro. Quem prepara as questões para um contrato deve ser capacitado para tal”, apontou. E as “inexatidões” das respostas devem ser declaradas de imediato aos proponentes, pelas seguradoras, logo que as receber.
O ministro do STJ, Paulo Sanseverino, exaltou o mercado de seguros como extremamente complexo e de suma importância para a economia brasileira, em suas palavras, representando atualmente cerca de 5% do PIB. “Com a flexibilização das bases contratuais a tendência do mercado é a de ficar ainda mais complexo, com alternativas diversas surgindo”, pontuou.
Na primeira parte da live, Sanseverino tratou dos aspectos gerais do contrato de seguro à luz do direito brasileiro e sob o viés da jurisdição do STJ. Segundo o ministro, contra riscos pré-determinados, o conceito jurídico desvenda a face do contrato. “A distribuição coletiva dos custos do risco individual são a base econômica do contrato de seguro”, afirmou. Entretanto, o ministro ressaltou a fraude praticada por segurados como causa para a desconfiança de seguradoras, que preferem muitas vezes recorrer à judicialização. Para Sanseverino, a cultura da boa-fé ainda tem que ser estabelecida no mercado. “O mutualismo é a base econômica do contrato de seguro, a boa-fé objetiva a alma do seguro”, destacou.
O dever de declaração inicial do risco no contrato e o dever do segurado também foram questões abordadas pelo ministro. Segundo Sanseverino, o segurador tem o dever de esclarecer o conteúdo do contrato, as principais cláusulas contratuais e os riscos com cobertura ou não da respectiva apólice. Já o segurado deve prestar informações minuciosas e verídicas para a seguradora. A falta de clareza entre as partes repercute tardiamente, já que as informações são elementos essências que definem um contrato, desde o valor até se haverá cobertura para o risco.
Sanseverino destacou a importância das novas normativas da Susep, mas insistiu por ainda mais mudanças. “Precisamos de regulação específica mediante lei especial para o contrato de seguro, para que tenhamos um microssistema normativo mais atento para a importância socioeconômica do seguro no direito brasileiro”, concluiu.
Os especialistas esclareceram à dúvidas inqueridas pelos telespectadores do evento em todos os dias do evento. Os encontros do simpósio podem ser assistidos na íntegra no canal da ESA/SP.
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